VALE A PENA REFILMAR | BRAVURA INDÔMITA

Por Adilson Carvalho

Eu nasci no ano de lançamento de Bravura Indômita (True Grit), o filme que deu o único Oscar para o lendário John Wayne (1907/1979). Somente o assisti quando exibido na TV e foi uma experiência marcante devido à sua história impactante, retirada do livro de Charles Portis publicado originalmente em 1968. A maravilhosa trilha sonora de Elmer Bernstein (1922/2004) intensifica a experiência dessa história de justiça e vingança em torno de um xerife alcoolotra Rooster Cogburn (Wayne), contratado pela jovem Mattie Ross (Kim Darby) para capturar Tom Chaney (Tom Corey) que matara o pai dela e fugiu para território indígena no Arkansas de 1880. O rabugento justiçeiro faz jornada acompanhado do Texas Ranger La Boeuf (Glenn Campbell) e da indomável Mattie, que insiste em ir junto. Enfrentam vários obstáculos, como bandidos além do perigoso Ned Pepper (Robert Duvall), parceiro de Chaney. O filme dirigido por Henry Hathaway (1898/1984), com quem trabalho em um total de 6 filmes, discute a fina linha divisória entre vingança e justiça. John Wayne havia inicialmente prometido o papel de Mattie Ross para sua filha Aissa Wayne, mas o diretor Henry Hathaway se recusou a escalá-la. Outra quase escalação foi o nome de Elvis Presley ,considerado para o papel de La Boeuf, o Texas Ranger. No entanto, o “Coronel” Tom Parker, seu empresário, insistiu que Presley deveria ficar com o papel principal. Apesar de seu sucesso comercial, John Wayne não ficou satisfeito com o filme finalizado. Ele não gostou muito da atuação de Kim Darby e, ao promover o filme para seu lançamento nos EUA em junho de 1969, disse aos entrevistadores que havia estrelado filmes muito melhores, citando No Tempo das Diligências (1939) como exemplo.

Na cerimônia do Oscar, em 9 de abril de 1970, Wayne disse pessoalmente a Richard Burton, que achava que este é quem deveria ter ganhado o Oscar por sua interpretação do Rei Henrique VIII em Ana dos Mil Dias (1969). O lendário Jay Silverheels, famoso pelo papel de Tonto na série de TV The Lone Ranger, tem uma participação não creditada como um dos homens condenados no enforcamento. O filme ganhou seis anos depois a sequência Justiçeiro Implacável (Rooster Cogburn). Diferente do livro em que o personagem de Rooster Cogburn tem cerca de 40 anos, John Wayne tinha 61 anos quando o filme foi feito. Ao receber o Oscar por sua atuação, John Wayne disse: “Uau. Se eu soubesse disso, teria colocado esse adesivo 35 anos antes”. O único filme pelo qual John Wayne ganhou um Oscar. Foi sua segunda indicação, a primeira foi por “The Sands of Iwo Jima“. Kim Darby disse que John Wayne era muito gentil com ela e que era um prazer trabalhar com ele, sempre o primeiro no set. Um dia após a conclusão do filme, a Paramount realizou uma sessão de fotos para as principais estrelas que estavam trabalhando no estúdio na época. Além de Wayne, havia (entre outros) Barbra Streisand, Clint Eastwood, Goldie Hawn e Robert Evans no meio. Darby estava observando sozinha quando Wayne a notou. Ele parou a filmagem, disse: “Ei, garota“, e trouxe Darby para o centro da foto. “Não é maravilhoso?”, disse ela a um entrevistador em 2011.

Já Jeff Bridges tinha 60 anos quando interpretou Rooster Cogburn no remake dirigido pelos Irmãos Joel e Ethan Cohen (Onde os Fracos não tem vez) em 2010. Apesar de Mattie Ross ter o maior tempo de tela e ser considerada a protagonista, Hailee Steinfeld foi indicada para Melhor Atriz Coadjuvante em muitas premiações, incluindo o Oscar. Devido às leis de trabalho infantil, Joel Coen e Ethan Coen não puderam filmar nenhuma cena após a meia-noite com Hailee Steinfeld (especialmente difícil porque o filme contém muitas cenas noturnas) e, devido a problemas de programação, sempre que há uma tomada de outro personagem por cima do ombro ou das costas de Mattie, a personagem foi interpretada por um dublê adulto, não por Steinfeld. A refilmagem foi um retorno ao material original de Charles Portis, e não uma repetição do filme de Hathaway. Talvez por isso, devido claro à habilidade de seus diretores, o filme seja um caso raro de uma refilmagem que supera o filme original, ou se preferir se equipara a ele. Foi o primeiro filme dos irmãos Coen a arrecadar mais de US$ 100 milhões nos Estados Unidos. Os Irmãos Cohen usam de humor negro ausente na versão de 1969. No original de Henry Hathaway, Rooster Cogburn usa o tapa-olho no olho esquerdo, enquanto no remake de 2010, o tapa-olho é usado sobre o olho direito de Cogburn, o que é fiel ao romance. Mas seja qual for este, o que é relevante é o impacto dessa história onde a bravura do título se refere à Mattie, incansável e determinada. Nisso Kim Darby entrega uma atuação mais envolvente que Steinfield. O xerife Cogburn pode ser durão e esperto como uma raposa, mas é Mattie quem sustenta o eixo narrativo, muitas vezes é quem dá as ordens, mas sobretudo é ela que nos dá o tom do que significa uma coragem sem limites.