Por Paulo Telles
E vamos para mais um caso em Isto é Fato…Não Fita!!!
Nem sempre nossos “causos” são referentes a um astro ou uma estrela de cinema, ou mesmo um diretor ou produtor. E nem sempre precisa se ligar aos bastidores da velha Hollywood. Basta nos conectarmos pura e simplesmente a magia do cinema, podendo ser distante da meca cinematográfica. O fato aqui em narrativa ocorreu numa sala de projeção, aqui mesmo no Brasil e não envolveu nenhuma celebridade do mundo da Sétima Arte, um fato que ocorreu há mais de 70 anos.
Tudo ocorreu numa Semana Santa em Recife, por volta de 1946 ou 1947, segundo o crítico e jornalista, já falecido, João Lepiane, da extinta revista Cinemin. O Cine Glória de Recife, que veio a tornar-se patrimônio cultural da cidade (hoje o prédio é a Galeria Glória e funcionou como cinema de 1926 a 1984) exibia nas quintas e sextas feiras da Paixão o tradicional filme da Pathé A Vida de Nosso Senhor Jesus Cristo (1903), em sessões que começavam as 10h da manhã e estendiam-se até meia noite.
A sala de projeção exibia, como de praxe, uma programação dupla, normalmente um curta policial ou um faroeste, ou dois episódios de um seriado, que eram lançados na segunda feira e ia até quarta-feira, só voltando em cartaz no sábado de Aleluia e Domingo de Páscoa, para dar lugar ao filme religioso francês (dirigido por Ferdinand Zecca) que era garantia certa de bilheteria na ocasião por conta do feriado litúrgico. No entanto, na Sexta Feira da Paixão, em uma das sessões noturnas, quando a plateia vê Cristo com a cruz no ombro subir o Monte Calvário, eis que surge na tela, repentinamente, a figura do ator Charles Starrett (1904-1986) como o famoso Durango Kid, em disparada pelas planícies do Oeste, montando seu belo cavalo branco Raider.
Pandemônio, confusão na plateia, luzes acesas, assovios… uma bagunça durante alguns minutos, mas logo tudo votou ao normal. As luzes se apagaram e, na tela, se vê novamente o Filho de Deus a caminho de seu martírio! O que ocorreu é que o projecionista, naturalmente cansado pelo esforço concentrado dos últimos dias, em vez de colocar no segundo projetor a bobina com a continuação da Vida de Cristo, se atrapalhou e colocou a bobina com dois rolos do filme de Durango Kid, que estavam prontos no armário desde quarta feira daquela semana, e que seria usada no dia seguinte, sábado de Aleluia, com a volta da série do fabuloso herói mascarado em cartaz.
Um fato em nossos registros, afinal, Isto é Fato…Não Fita!
Paulo Telles é crítico de cinema, escritor e radialista (DRT 21959-RJ) além de colunista e redator do blog Cine Retro Boavista.
https://cineretroboavista.blogspot.com/
“Isto é Fato… Não Fita! “ Era um quadro do extinto programa Cine Vintage, pela Web Rádio Vintage.
cinemacompoesia.wordpress.com 