CLÁSSICO REVISTADO : CASABLANCA 80 ANOS – 1ª PARTE

Por Adilson Carvalho

Um filme da importância de “Casablanca” recebe no CCP um artigo em duas partes para celebrar os 80 anos desse clássico que nutre inúmeras histórias de bastidoresl

Michael Curtiz dirige Bogart e Bergman

        “É sempre a mesma história. Uma luta por amor e glória. Uma questão de fazer ou morrer.”  Esses versos extraídos da letra de “As time goes by” – eleita a segunda melhor canção do cinema americano pelo AFI  ( American  Film Institute ) – tema da história de amor de Rick Blaine, um americano expatriado rude e sisudo,  e Ilsa Lund, a bela esposa de um dos líderes do movimento de resistência nos conturbados idos de 1942, quando a Alemanha Nazista expandia agressivamente seus domínios territoriais e políticos em um conflito que já tomava então proporções globais. (Os Estados Unidos aderiram ao conflito em Dezembro de 1941). A Warner Brothers havia adquirido os direitos de filmagem da peça “Everybody comes to Rick’s” de Murrey Burnett e Joan Allison, que nunca fora encenada, por U$$20,000 – preço alto para a época. O roteiro tornou-se um dos filmes mais cultuados de todos os tempos, que veio a ser dirigido pelo húngaro Michael Curtiz, que durante 27 anos trabalhou fielmente para os Estúdios da Warner , tendo dirigido clássicos como “Capitão Blood” (1935) e “As Aventuras de Robin Hood” (1938) entre outros.

Everybody comes at Ricky’s

O Filme : A história de “Casablanca” é – a primeira vista – um romance convencional tendo a Segunda Guerra como pano de fundo. O café Rick’s reúne, como diz o nome original da peça, todos da cidade marroquina de Casablanca – no norte da África – ocupada pelos nazistas e sob a administração da França. Funcionando clandestinamente está um cassino frequentado pela mais alta nata do submundo da cidade: golpistas, ladrões, assassinos, alemães, franceses,e refugiados,  todos jogando com a sorte e muitos sonhando em conseguir ganhar o suficiente para fugir de Casablanca. É nesse lugar de sonhadores e desiludidos que o ladrão Ugarte (o ótimo Peter Lorre) deixa sob os cuidados de Rick (Humphrey Bogart) valiosos vistos que permitem, a quem os possuir, o trânsito livre através da Europa Nazista. Ugarte morre na prisão do Capitão Renault que, para agradar ao recém-chegado Major Strasser (Conrad Veidt), deseja prender um dos maiores líderes da resistência, o tcheco Victor Lazslo (Paul Henreid) , que se refugia em Casablanca acompanhado de sua esposa. Em momento marcante do filme, ao som da belíssima “As time goes by”, cantada e tocada no piano por Sam (Dooley Wilson) – que na verdade não sabia tocar piano e apenas fingia enquanto um pianista tocava por detrás das câmeras -, Rick descobre que a esposa de Victor é uma mulher de seu passado, que conhecera  na França às vésperas da ocupação de Paris, quando Rick era um mercenário que auxiliava os aliados e Ilsa (Ingrid Bergman) vagava sozinha por achar que Victor estivesse morto. O isolacionismo de Rick disfarça a amargura de um homem que foi abandonado por Ilsa e, por isso se sente traído, conforme revelado no flashback que Curtiz emprega no meio do filme, o que humaniza o personagem de Bogart perante a plateia. O dilema que se forma é ajudar Ilsa a fugir e perdê-la para sempre ou virar as costas e mantê-la em Casablanca, o que também significaria perdê-la já que seu idealismo político é a essência do que a faz respirar, o que Rick percebe quando na cena final diz que “Se ela ficar, vai se arrepender um dia

Humphrey Bogart, Ingrid Bergman, Paul Hemreid e Claude Rains (sentido anti horário)

Essência do Romance: O dilema dos personagens Rick e Ilsa se forma em torno da exaltação democrática – bem de acordo com o espírito patriótico da Hollywood daquela primeira metade dos anos 40 – que se opunha à brutalidade do Nazismo que assolava o mundo. Todos os personagens refletem esse clima instável do mundo em guerra e escondem suas intenções, suas verdadeiras naturezas, de forma que o cínico (Bogart) disfarça seu sentimentalismo, a idealista (Bergman) demonstra traços de egoísmo, o oportunista (Rains) também consegue ser leal na virada decisiva para a história. Esse clima de incerteza em que nem tudo é transparente foi reforçado pelas constantes mudanças no roteiro, que foi reescrito durante as filmagens, e que Michael Curtis soube magistralmente capturar em cada cena. Curtiz, que reza a lenda era extremamente exigente em cena, e a conduzia com seu inglês macarrônico, foi maestro na condução de um elenco sensacional, tocando em um tema delicado dos tempos de guerra e desenvolvendo uma história envolvente e emocionante sem resvalar no piegas ou no ufanismo. Como não se sentir tocado na sequência em que o personagem de Paul Henreid, com o consentimento de Bogart, desafia os alemães cantando a Marselhesa e inflamando o patriotismo francês até então adormecido.

Acompanhe a segunda parte dessa matéria na semana que vem.

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